segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Boas notícias...

Colher para Semear
Maçãs há muitas
"(...) Velho mundo novo

Propomos um pequeno exercício: quantos tipos de maçãs conhece? Provavelmente, a reineta, a golden e a starking. E de feijões? Talvez o frade, o vermelho, o manteiga, o branco...

Então e o feijão-patareco, o papo-de-rola, o pedra, o congo, o musgo, o dencante, o canário e o boneco? E as maçãs bravo-de-Esmolfe, malápio-de-Gouveia, camoesa e pardo-lindo? Esta última era a preferida de Eça de Queiroz, e só não se extinguiu por completo graças aos esforços de José Miguel Fonseca e da Associação Colher para Semear - Rede de Portuguesa de Variedades Tradicionais.

Quem semeia ventos...

Em 1984, um estudo levado a cabo pela Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO) concluiu que a perda de biodiversidade agrícola ronda os 75% em todo o mundo.

O inimigo público número um está claramente identificado: o negócio das sementes. Seria de imaginar que um produtor de abóboras, por exemplo, utilizasse sementes de cada colheita para plantar a seguinte, não? O pior é que esse produtor iniciou a sua actividade com sementes de uma marca multinacional, à falta de um pequeno comerciante local, como os que havia antigamente, e ao fim de uma ou duas colheitas constatou que as sementes que colhia já haviam perdido a capacidade de germinar. Resultado: teve que voltar a comprar sementes (à mesma marca multinacional, ou a outra em tudo semelhante). Sementes híbridas, ou até geneticamente modificadas, para medrarem em qualquer ponto do planeta. O negócio é milionário, mas a factura pesa cada vez mais nas contas da Mãe Natureza.

Operação de salvamento

José Miguel da Fonseca, de Figueiró dos Vinhos, Graça Ribeiro, de Sesimbra e José Pedro Raposo, de Ferreira do Alentejo, agricultores e guardiões de sementes, são fundadores da Colher para Semear. A partir de um aturado trabalho de investigação, e de muito contacto directo com os pequenos agricultores pelo país afora, foram conquistando sócios e solidificando a Rede Portuguesa de Variedades Tradicionais.

O chícharo (uma leguminosa semelhante ao grão-de-bico) de Alvaiázere, a abóbora pau da península de Setúbal ou o grão-de-bico preto de Ferreira do Alentejo são apenas algumas das espécies cuja sobrevivência está assegurada (às quais se juntam todas aquelas referidas no início do texto e ainda o milho pata-de-porco, o tomate-de-viagem, um trigo antigo de nome espelta...)

Mas as quantidades ainda não são as desejadas. Que o diga Aimé Barroyer, o conceituado Chefe que dirige a cozinha do luxuoso Valle Flor, restaurante do hotel Pestana Palace, em Lisboa. Cliente habitual da Colher para Semear, nem sempre consegue obter tantos feijões papo-de-rola ou grãos-de-bico pretos quantos necessitaria. A solução passa pela expansão da Rede. Daí que a angariação de novos sócios (investigadores, produtores, guardiões de sementes, etc.) seja uma das prioridades da Associação, a par da formação de agricultores e da informação do público em geral.

Duas boas notícias

A mudança faz-se anunciar pouco a pouco. Por cá, uma equipa liderada por Agostinho de Carvalho, professor da Escola Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz, propôs-se estudar os compostos químicos das maçãs regionais da Beira, em comparação com algumas das variedades exóticas que proliferam no comércio da especialidade. Do lado das regionais estão em análise, há alguns meses, a bravo-de-Esmolfe, a malápio-de-Gouveia e a camoesa, às quais foram reconhecidos valores nutricionais notáveis. Os resultados serão divulgados no final deste ano, mas tudo aponta para que comprovem as suspeitas: as maçãs regionais da Beira têm um impacto positivo na saúde pública e na prevenção de doenças.

Lá fora, a Amigos da Terra Internacional, uma rede de entidades ambientalistas sem fins lucrativos, reconhecida pelas Nações Unidas desde 1971, com actividade em 68 países, divulgou o relatório «Quem Beneficia com os Grãos Geneticamente Modificados? Uma análise do desempenho global dos grãos geneticamente modificados 1996-2006», no passado dia 9 de Janeiro. As conclusões são desastrosas para a indústria dos transgénicos, mas bastante optimistas no que diz respeito à biodiversidade agrícola.

Ao que parece, a missão falhou: as sementes transgénicas obrigam ao aumento do uso de produtos químicos na agricultura, prejudicando a natureza; não conseguem colheitas maiores, comparativamente à agricultura convencional; não trazem benefícios ao consumidor, nem em termos de qualidade nem de preço dos produtos; não têm contribuído para aliviar a fome e a pobreza na África ou em qualquer outro lugar (um dos argumentos mais fortes a favor do seu uso), até porque mais de 70% das plantações de transgénicos em larga escala continua limitada a dois países, os Estados Unidos e a Argentina.

Colher para semear é o processo que a Natureza utiliza desde a era Paleozóica. E a Natureza nunca se engana, e raramente tem dúvidas...

Contactos:

Colher Para Semear - Rede Portuguesa de Variedades Tradicionais
Quinta do Olival, Aguda
3260 Figueiró dos Vinhos
José Miguel Fonseca - 236 622 218
Graça Ribeiro - 91 490 9334
fcteixeira@esb.ucp.pt
gcaldeiraribeiro@gmail.com "

Fonte: LifeCooler

Etiquetas: ,